Cinquenta e quatro quilos. Foi um dos pesos mais baixos que me lembro, na minha existência. Um ano antes de engravidar do Manel. E nunca gostei do que vi no espelho. Achei sempre que estava sempre qualquer coisa a mais, ou nas ancas, ou nas pernas. Entretanto, engordei. Foram quilos galopantes. Daqueles que se vão notando de semana a semana. A frustração e a angustia que me consumia, porque cada vez mais deixava de gostar realmente do que via em mim. Calças postas de parte, túnicas mais largas, pouca confiança e amor-próprio. Entretanto, engravidei. Deixei de me preocupar com as formas do corpo, para me importar verdadeiramente com o que gerava dentro de mim.
O choque foi-se dando lentamente quando nasceu o Manel. Os últimos dez quilos a perder para chegar aos sessenta, que tinha antes de engravidar, pareciam não querer sair de mim. Tinham-se instalado para sempre à volta da minha cintura, nas bochechas da cara, nas coxas. Mais uma vez, olhar para mim, ao espelho e aceitar o que via, era um grande desafio. Não se tratava de falta de vontade ou de espírito de sacrifício. A verdade é que eu nunca fui muito dada a ginásios e as dietas não me seduzem. E os meus horários não me permitem ter uma vida organizada no tempo e no espaço, para poder investir assim em mim. Na verdade, qualquer desculpa que eu pudesse dar para não ter feito muito por perder os quilos que me incomodavam, não eram verdadeiras desculpas. Eu só inventava escapes para a inércia, para a preguiça. No fundo, do que é que eu estava à espera? Não existem soluções milagrosas. Se queres trabalhar o teu corpo, tens de fazer isso mesmo: trabalhar!
Aos poucos [muito lentamente] tenho perdido um ou outro quilo. De vez em quando assumo atitudes radicais: dieta rápida, detox, batidos. Tudo coisas que nos iludem de uma realidade que está mesmo à nossa frente: não existe uma dieta que funcione verdadeiramente. O que nós temos de aprender é a fazer uma alimentação cuidada, saudável. E precisamos de exercício físico para tonificar o nosso corpo. Precisamos de aprender a comer e precisamos de nos exercitar. Tudo q.b., tudo com peso e medida, tudo naturalmente e sem obsessões.
Mas, acima de tudo isto, existe a maior das motivações: amor-próprio. Gostarmos de nós e sentirmos que estamos bem com o corpo que temos, é o nosso melhor aliado para conseguirmos estar em paz.
Acredito que muitas destas inquietações e desconfortos se prendem com a imagem que a sociedade define de beleza. Uma mulher magra é mais bonita, provavelmente mais bem-sucedida, é melhor aceite socialmente. Olhamos e criticamos mais facilmente uma mulher gorda, pela maneira como se veste, do que o fazemos com uma magra. Os padrões sociais invertem-se na hora de avaliar duas mulheres completamente diferentes, no que respeita a questões de peso. Infelizmente, esta é a realidade. A própria indústria de moda feminina exclui dos seus padrões os tamanhos grandes. Os manequins das montras parecem cidadãs do Biafra. É duro e cruel, mas é a realidade. Digam-me: quantas apresentadoras de televisão, por exemplo, estão acima do peso? Ou actrizes? Vivemos com a imagem do que o que vende é magro, seco, sem gordura localizada. E isto entra pelo nosso subconsciente a dentro. Infalivelmente.
E vai daí, dou de caras com esta menina, toda ela roliça, com um sorriso encantador e uma cara linda. Pela primeira vez, a Pirelli, conhecida por lançar calendários destinados ao público masculino [os célebres calendários dos mecânicos, serralheiros e afins], fotografa e publica entre meninas de cintura de vespa e rabinhos pequeninos e empinados, a bonita Candice Huffine. Contra todos os padrões de beleza impostos. Num acto misto de rebeldia e coragem, onde se mostra a beleza das verdadeiras curvas femininas. Ela, que ao lado das outra modelos, dá uns quinze a zero em naturalidade e autenticidade. Ela, que pela primeira vez e verdadeiramente, representa a maioria das mulheres neste planeta. Com as suas gordurinhas, a celulite, as covas nos joelhos, o peito farto. E com toda a graciosidade que roça o saudável, que no fundo, é o que se quer.
Então, eu olho para mim. Estabeleci uma meta quando me determinei a perder peso. Fixei o alvo que marca os cinquenta-e-oito na balança. Tenho sessenta-e-três. Faltam cinco. Já não o vou fazer porque não gosto de me ver com tshirts justas. Vou fazê-lo só se eu quiser mesmo, não porque uma sociedade me mostra que tenho de o fazer. Até porque, felizmente, creio que o mundo em que vivemos está a acordar para este problema. E os passos estão a ser dados, pelas grandes marcas que nos apresentam a Candice e outras tantas, modelos que representam as mulheres reais. Com corpos reais. Sem medos ou preconceitos.
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