Quando era pequena ia muitas vezes com o meu avô. Gostava de entrar pela zona das frutas e das hortaliças. Gostava de cheirar as flores frescas, em grandes alguidares de plástico cheios de agua até cima. Adorava enterrar as mãos nas cestas com feijão e grão secos e fazê-los escorrer pelos dedos. Gostava do cheiro a alpiste e de ir mexer nas pás e nos copos de medidas. Fingia um pouco que trabalhava ali e estava a atender clientes. Não era muito amiga de ir ver o peixe, embora adorasse as bancas com gambas e camarão, tocar-lhes nos bigodes, sentir o cheiro da cozedura.
Ainda hoje guardo essa memória olfactiva da minha infância. Tenho saudades desses tempos, de quando o meu avô me dava uma moeda e eu ia comprar um bolo de arroz à senhora que os vendia à porta, guardados numa cesta de palha. Ou de quando me mandavam ir comprar pão à praça e eu trazia um caracol com açúcar e canela com as moedas do troco.
Esta manhã voltei ao mercado. Não o da minha terra, mas da terra que escolhi para viver. É tudo tão bom, tão genuíno e natural. As frutas parecem acabadas de colher; o peixe parece que veio directamente do mar. Recordei que era isto mesmo que eu pensava que acontecia, sem sequer saber que existiam lotas e fornecedores e todo um processo que envolve o caminho do produto à banca do mercado.
Quero que os meus filhos sintam também este cheiro, que o conheçam e o recordem um dia mais tarde. Que não saibam só o que é o corredor impessoal do hipermercado. Que ouçam as mulheres apregoar, que conheçam as caras de quem tem uma vida sofrida para vender fresco e ganhar a o pão-prá-boca, que conheçam as frutas feias que o grande comércio não exibe nas suas prateleiras mas que são quase sempre as mais doces, as melhores.
Quero voltar ao mercado sempre que puder. Mais que não seja para revisitar o mercado da minha infância, das minhas memórias. Aquele em que eu via o mundo a meio-metro do chão e ainda acreditava que os meus dias iam ser sempre assim.
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