Tinha cinco anos. Ela era quase do meu tamanho. Tentava abraçá-la para chegar melhor às cordas e era quase uma missão impossível. As cordas eram de aço, faziam os dedos doer muito. Chorei que me desunhei para a minha mãe me tirar daquela escola. Mas ela insistiu, que me fazia bem aprender música, nem que fosse fazer barulho. E ainda bem que insistiu. Até aos vinte anos, pertenci àquele grupo, que tantas experiências me deu a provar na vida. Onde quer que fosse, a viola vinha comigo, a tiracolo fazia parte do meu ser. Tocava o que me dava na gana, quando me dava na gana. O sentimento de rebeldia que te dão uns cabelos ao vento, enquanto tocas umas notas, como se mais nada no mundo importasse, senão aquele momento.. uma grande companheira, não tenho dúvidas nenhumas. E hoje, olho para ela, ali guardada no estojo, e às vezes as saudades rebentam pelas costuras e vou desenferrujar os dedos. Até sinto a emoção vir à flor da pele, como quando aos quinze anos, achei que seria grunge para sempre e que a minha vida era tocar. Ou quando aos dezoito decidi viver uma aventura hippie e a música era a deusa dos meus dias. Ou quando agora, aos trinta e três, dou graças por nunca me terem privado daquilo que sempre foi um dos maiores prazeres da minha vida, um motivo de orgulho, um escape, uma terapia.
Ele era um colega, que hierarquicamente estava abaixo de mim. Entrou uns anos depois de mim para esta empresa. Foi galgando lugares enquanto um macaco come uma banana. Não me perguntem como, nem porquê. Eu desconfio, mas ia ter de dizer muito palavrão para me justificar, portanto permanecerei uma senhora de bico calado. De lugar em lugar, de tarefa em tarefa. Pouco me importa se tem a língua negra de tanta bota engraxada, se tem dificuldade em sentar-se ou se comeu o pão que o diabo amassou. Desde que ele não me prejudique, ele lá e eu aqui, e amiguinhos como dantes. Mas quando a verborreia atinge patamares de superioridade, não há como passar despercebido. Uma pessoa pode ignorar, mas e conseguir? É como tentar ignorar um mosquito a meio da noite, no quarto. Tu bem tentas, mas é mais forte que tu. A criatura vai fazer uma apresentação numa reunião. Já de si, a situação tinha aqui material de sobra para que o Ricardo Araújo Pereira fizesse um brilharete. O ser está incha
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